terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

O começo dessa História



Fala, minha gente! Tudo bem com vocês?

Pois é, missão dada (por mim mesmo) é missão cumprida (por mim mesmo também)!
Sejam bem-vindxs ao segundo texto do nosso blog.

Como firmei compromisso na primeira postagem e na descrição deste blog, começaremos hoje as discussões que envolvem gastronomia e pesquisa! Sim! Para isso, então, quero convidá-los a dividir comigo esses apontamentos introdutórios que comporão a postagem.

Antes de iniciarmos, porém, vale ressaltarmos que os textos que darão base a esta discussão são a entrevista com o historiador Jacques Revel, autor do capítulo intitulado “Os usos da Civilidade”, na obra “História da Vida Privada 3”, de P. Ariés e G. Dubby,  além do artigo “A História da Alimentação:balizas historiográficas”, dos professores Ulpiano Bezerra de Menezes e Henrique Carneiro.

De antemão, é necessário destacarmos dois aspectos fundamentais:
- A alimentação só galga espaço como objeto sistematizado pelas ciências com a Antropologia do século XIX. Antes disso, a alimentação se limitava a tratados culinários e médicos (teremos uma postagem sobre isso em breve). Logo, pensar a alimentação a partir de uma perspectiva sistematizada é um movimento extremamente recente;
- O enfoque dado às discussões apresentadas contará com material produzido por pesquisadores de várias áreas, mas será direcionado por um pesquisador da História. Assim, caso alguns termos fiquem técnicos demais ou difíceis de compreender, deixem nos comentários, darei um jeito de tornar mais palatável assim que possível. Vale ressaltarmos que não se trata de um texto com rigor acadêmico, mas de um espaço de fomento à curiosidade. Caso queira se aprofundar no assunto, os link estão disponíveis acima.

Já de início, vale ressaltarmos que as estacas que delimitam o espaço de produção intelectual nessa área se confinam num espaço delimitado. Logo, França, Itália, Alemanha, Espanha e Áustria são os países pioneiros na produção intelectual ligada à alimentação. Passaremos pelo Brasil também, mas é necessário não perdermos de vista que a produção nessa área ainda é pouca aqui em nosso país.
Apesar da sistematização das produções na área serem recentes, a história é repleta de representações que referenciam a alimentação desde a antiguidade, e são produzidas a partir de seus vários enfoques. Menezes e Carneiro (p. 3) distinguirão, portanto, esses enfoques em cinco grandes subcategorias: o biológico, o econômico, o social, o cultural e o filosófico.

A partir dessa segmentação, a alimentação é percebida em suas várias nuances. A alimentação a partir do enfoque biológico tem sua ligação fortemente marcada com os estudos médicos, já que é desde a Antiguidade que as dietas alimentares compõem parte importante no tratamento de doenças, além dos conhecimentos produzidos em botânica e zoologia e propiciadora à emergência da nutrição no século XIX. O enfoque econômico nos deixa claro a importância dos alimentos nos ciclos econômicos ao longo da história: especiarias, cana-de-açúcar, café, tabaco, farinha. A noção de cultura material, inclusive, é o que convoca a história a dar importância à alimentação no século XX. O enfoque social, por sua vez, tema principal da expressão deste blog, situa-se na própria formação das sociedades, uma vez que estas têm em comum a língua e a alimentação. Apesar de estar na base da formação social, a alimentação ganha suas expressões como objeto da História, de fato, a partir da década de 1970. Ao lado do social, o enfoque cultural busca compreender a alimentação (técnicas de cocção, ingredientes, dieta etc.) como expressão além da nutricional. Dito de outra forma, busca-se compreender os meandros ligados aos fazeres alimentares, não à ingestão do alimento em si; busca-se perceber os códigos alimentares. Por fim, a questão filosófica se desmembra em ética (escolhas alimentares, por exemplo) e estéticas (de foro íntimo às questões culturais e sociais).
Essas percepções apontadas pelos historiadores brasileiros são importantíssimas para entendermos parte do atual percurso do trabalho com a história da alimentação. Mas isso só é possível hoje porque o século XX presenteou a História com discussões que extrapolavam as biografias sobre as grandes personalidades do passado e os ciclos econômicos.

Visando ampliar o debate historiográfico no século XX, fundou-se na França a revista intitulada Annales. As publicações da revista eram extremamente revolucionárias para a as época, quando a história começa a ampliar suas nuances de reflexão, revendo seus próprios conceitos (o que é História? como fazer História?) e ampliando seus objetos de análise. Em franco diálogo com a Antropologia, a História se permitiu novas abordagens e novos métodos. Foi sob a direção de Fernand Braudel, porém, que alimentação conseguiu entrar, de fato, para várias publicações na revista. E foi sob a direção de Jacques Revel que a alimentação ganhou seu status de objeto de expressão da cultura material social. Isso representou um marco!
Apesar disso, no Brasil a alimentação como objeto traçou um rumo bem peculiar. Fomos, inclusive, desbravadores de abordagens étnicas com Luís da Câmara Cascudo! Querem saber mais sobre isso? Tema da próxima postagem!

Por hoje é isso. Gostaram? Comentem!

Aproveito o ensejo para convidá-lxs a lerem o meu texto que será publicado no próximo domingo de carnaval (dia 07/02) no jornal A Tribuna. Reforçando a compreensão de gastronomia como manifestação cultural e prática histórica, trouxe à tona um tema que gostei muito de refletir: a história da gourmetização. Pois é, as preferências alimentares figuram ao longo da história (farei um post sobre isso em breve) e são aferíveis a partir de uma série de documentos – cito dois em meu artigo. Leiam e façam a crítica aqui nos comentários.


Outra coisa muito bacana para o crescimento das pesquisas em gastronomia: a Revista Ágora, publicada pelo Departamento de História e Geografia da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), abriu nova chamada de artigos. Com o dossiê intitulado “Gastronomia: saberes e fazeres”, a revista dá visibilidade ao campo de estudos em questão aqui neste blog, além de fomentar as produções na área. Com uma temática ampla, e por se tratar de uma revista do departamento de História da universidade, as apostas estão circundando os artigos que consigam contemplar os fazeres tradicionais gastronômicos. Os artigos serão aceitos para emissão de parecer até o dia 31 de março. Se você quiser conhecer alguns dos fazeres gastronômicos registrados como patrimônio imaterial brasileiro (vai que rola uma inspiração, né?), acesse o link dos dossiês de registros do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). 

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