Fala, minha gente. Tudo bem com vocês?
Essa semana eu vim cumprir a minha promessa, passando pelos vários imbróglios gourmetizadores por aí. Rs.
A análise do "Gastronomia no Brasil e no Mundo", de Dolores Freixa e Guta Chaves, compõe o arsenal do "Na panela tem... #3". A edição e análise é a mais recente (a 3a.), publicada em 2015.
As autoras, Dolores e Guta são estudiosas da gastronomia de forma geral. A primeira, historiadora e professora do curso de turismo e gastronomia, e a segunda jornalista de formação, trabalhou na revista Gula, a referência do início dos anos 2000. Autoras entusiasmadas com a gastronomia e condições de viabilidade para se produzir um livro, vamos lá conferir a obra.
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(a imagem é ainda da primeira edição, de 2009. O atual vem escrito "3a. edição revisada e atualizada" do canto superior e esquerda)
Bom, preciso começar dizendo que o livro é lindo! Atual quanto às suas informações, provocativo quanto às reflexões, e uma importante base para se pensar a gastronomia no Brasil e no mundo!
Os "Petiscos da História", recurso fantástico utilizado pelas autoras, busca "colar" o conteúdo ampreendido àquilo que é parte do cotidiano. Assim, conseguimos transitar melhor entre as questões mais abstratas e, de certa forma, encontrar conforto quando deixamos aquilo mais palpável.
O Livro se divide em vários capítulos, logo, farei brevíssimos comentários sobre cada um deles!
Em "Uma cultura chamada gastronomia" traz à tona questões importantes! Além de convocar reflexões sobre o que é gastronomia, fala-se sobre cozinha e culinária, sua ligação à alimentação, a emergência dos restaurantes (e a noção de restauração), amarrando tudo à história da gastronomia.
No capítulo 2, "pré-história e história antiga", vai nos colocar quais horam as contribuições dos humanos doa primórdios, buscando evocar as formações sociais e sua relação à alimentação. Civilizações e "berços de saber gastronômico" são discussões que irão aparecer por aqui.
Em "europa medieval, árabes e bizantinos", leremos um pouco da transformação/complexificação social emergente neste momento, o que o cristianismo protagonizou junto a toda a formação social eupeia. Fala-se do clero, do tímido reaparecimento das cidades, o Le Vindier (livro de cozinha medieval), do império bizantino e das Árabes - de suas contribuições, na verdade. Tais contribuições, inclusive, ultrapassam ingredientes e chegam às formas como se servem os alimentos.
No trecho "renascença, a contribuição italiana" a autora corrobora com o que fazem a maioria dos autores: colocam sobre as costas de Catarina de Médicis a questão da emergência da corte francesa. Para quebrarmos um pouco essa perspectiva, sugiro que leiam esse debate aqui. Além disso, a reemergencia de uma cozinha regional e os laços entre a França Moderna e a Itália Renascentista são um marco do período.
No capítulo "expansão marítima e a américa", mais que a fala sobre especiarias, vale o processo de compreensão de ganhar o mundo. A troca de ingredientes e hábitos alimentares ocorrida entre regiões é o escopo da discussão. Um trabalho fantástico.
O capítulo 6 traz "a influência da gastronomia francesa", nos mostrando que, após o contato com a Itália, França se tornou o centro de referência dos bons modos à mesa, às festas, aos bailes.Os chefes dos reis passam a figurar como personagens importantes. As bebidas do novo mundo já fazem parte do cotidianos da aristocracia (chá, café e chocolate).
Em "a idade de ouro da gastronomia francesa" emergem os debates sobre os primeiros críticos gastronômicos, os chefes de ouro, a emergência da indústria hoteleira de luxo, além de refletir sobre a ciência à favor da alimentação e quais são eras expectativas para o século XX.
No capítulo "idade contemporânea", muitas da respostas são encontradas, nem sempre num sistema sustentável às demandas do século XX. Vale ressaltar a integração do mundo dos vinhos com o resto do mundo, além de um turismo cada vez mais voltado à contemplação do regional e que busca entender os movimentos migratórios intensos dos séculos XIX-XX.
No trecho "Brasil", o livro o divide em "heranças, colonial, império, século xx, cozinha típica regional", finalizando o processo em Globalização. Assim, vale ressaltarmos a disposição da autora de pôr o Brasil num papel tão importante quanto o da cozinha do mundo europeu.
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O livro é muito, muito maravilhoso. Erroneamente, ao avaliá-lo há 3 semana, dei 3 frigideirinhas no meu instagram. Errei! Este livro merece 4 frigideirinhas!
As 4 frigideirinhas não sã em vão: apesar do trabalho magnífico das autoras, elas assumem - num sem fim de vezes ao longo o texto - a gastronomia como sendo a "alta cozinha" (seja lá o que isso signifique, de fato". No capítulo que trata sobre cozinha na idade média, num dado momento elas evocam a "cozinha rudimentar do camponês" (p. 60), falando da não nobreza dos ingredientes que cresciam rentes ao chão, como legumes e leguminosas. Além disso, escritos de cozinha registram o que comem os nobres, não os camponeses.
Isso é um pouco inconsistente, a meu ver. Em grupos que vivem próximo, a alimentação não seria assim, tão diferente. As aves, ingredientes nobres do medievo, compunham cotidianamente a mesa dos aristocratas, junto a pães e outros pratos muito parecidos com os que eram feitos pelos camponeses. Assim, penso que a cozinha camponesa seja também escrita nos compêndios culinários da Idade Média; ao historiador, porém, cabe o estudo e as reflexões quanto a estes meandros.
Apesar desse pequeno posto (e alguns outros, mas que pouco interferem na aprendizagem), o livro é extremamente acessível em termos de linguagem e informação.
A amazon.com.br está com essa obra em promoção, vale a pena conferir!
Espero que vocês tenham gostado e eu os aguardo na próxima semana.
Atééééééééééé!